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Acadêmico: Manoel de Sousa Ramos

Eu Manoel de Souza Ramos, sou apenas um Brasileiro!

Filho de um pescador com uma dona de casa. Meu pai, já falecido, chamava-se Manuel Ramos de Sousa, natural de Ajuruteua, mas descendente de nordestinos, os mesmos que fundaram a comunidade de Ajuruteua

Minha mãe chama Maria de Jesus de Sousa Ramos, natural de Candido Mendes, no Maranhão, chegou e Ajuruteua ainda criança.

Nasci em Belém do Pará, capital do nosso estado, aos trinta de dezembro de mil novecentos e setenta. Aos dois meses de idade meus pais me trouxeram para Ajuruteua, onde vivo até então.

Como todo filho de pescador de Ajuruteua no século passado, tive uma infância sem muito que festejar, mas ainda assim posso dizer que fui feliz ao lado dos meus amigos e irmãos.

Foi na vila de pescadores de Ajuruteua, que comecei meus estudos, na pequena escola local. Escola esta que, sem nenhuma estrutura, foi responsável pela alfabetização e educação primária, até a quarta série, de centenas de pescadores até a década de oitenta do século passado.

Foi também nessa vila de pescadores que cresci com meus onze irmãos, aprendi com eles e para eles, a fazer do pouco o meu tudo, e que deram suporte para os memoráveis momentos da minha vida

Dois momentos distintos marcaram minha trajetória até aqui. Momentos que eu defino assim:

1. DA ESCOLA À PESCA

E essa história começa assim: estudei na pequena escola da comunidade, tudo o que está oferecia aos filhos de pescadores, somente até à quarta série, parei de ir à escola quando ainda era uma criança (12 anos), não por simples escolha, mas por uma enorme necessidade.

Meu pai, na época fora acometido de uma grave doença que o impossibilitava de trabalhar, e como sou o primeiro filho, de uma família de doze, embora fosse difícil para um filho de pescador, como já falei que a educação só era possível até a quarta série, meu pai tinha largos sonhos para conosco e já havia me matriculado em uma Escola (Luís Paulino Mártires), tive que abandonar a sala de aula e tornar-me pescador.

Ser pescador me impossibilitou de ir à escola, mas, não me tirou o desejo de estudar, de aprender e tornar-me alguém com valores diferentes de um simples pescador. por isso busquei o meu diferencial.

A princípio era difícil mesmo de acreditar que daria certo, imaginem um pescador, que passava um mês e até mais no mar, sem poder ir à escola aprender alguma coisa? Ou melhor, como seria possível uma pessoa que só aprendeu a pescar pensar que poderia ser um alguém diferente de pescador?

Não havia lógica. Mas, foi aí que a luz da minha mente brilhou, dizendo-me o que eu precisava fazer para que pudesse associar-me a questão política do funcionamento ideológico de nossa sociedade sendo apenas um pescador. Apenas com a prática da leitura. Esse foi o meu diferencial. A leitura.

Aprendi a ler fluentemente aos nove anos e não parei mais. Mesmo sabendo que o prazer de ler é uma proposta muitas vezes mal interpretada, mas, isso não significava que eu teria que morrer sem conseguir realizar o meu grande sonho.

E o prazer pela leitura, pelo querer sempre mais do conhecimento, me influenciaram a tornar-me um atleta na busca das diferentes culturas, até poder conquistar autonomia e escolher o meu próprio caminho. 

Embora a interação com as pessoas que me rodeavam fosse adversa à minha perspectiva de buscar conhecimentos, tenho plena certeza que foi muito importante para o meu sucesso, pois os diferentes modos de pensar só fazem aumentar o conhecimento cognitivo do ser humano.

Bom, eu parei de ir à escola, mas não necessariamente de estudar, fiz dos vários barcos de pesca que naveguei nos litorais do Pará, Amapá e do Maranhão, a minha sala de aula improvisada.

Para uma pessoa com um pensamento formado não seria problema, mas tratando-se de uma criança com doze anos de idade, o caso era muito especial, ter que aliar a educação aos riscos, os perigos do mar, era algo inacreditável.

E foi além desses riscos que sozinho, sem a mediação de um professor, construí o meu processo de ensino-aprendizagem. Busquei uma proposta pedagógica baseada paulatinamente nos vários livros que sempre levei comigo, que foram essenciais para o meu desenvolvimento cognitivo e que me fizeram apaixonar pela leitura e pela escrita.

Eu tinha um sonho: um dia parar de pescar e dar continuidade aos meus estudos. Concluir o Ensino Fundamental, o Ensino Médio e quem sabe um dia poder cursar uma Faculdade. 

 Uma utopia? A minha experiência de pescador dizia que sim, por um lado, porque a pesca nos leva à um círculo vicioso difícil de sair. Por outro, porque depois de vários anos de pesca e mar, tudo parecia estar defasado.

Mas como leitor, como conhecedor de inúmeras culturas, de diferentes formas de conhecimento, pelas minhas experiências com os livros, meu coração dizia que não.

Eu estava certo de que estava preparado para realizar esse sonho, mesmo que alguém apostasse que não, mas eu não dependia dos pessimistas, tudo dependia de mim mesmo. Havia usado os fundamentos filosóficos de Paulo Freire na pedagogia da libertação, pedagogia esta em que o homem deixa o seu estado de coisificação e passa a ser objeto de sua própria história e destino. 

Eu tinha certeza de que havia me tornado talvez sem perceber, um autodidata que só queria ter uma chance de provar isso para si mesmo.

 

2. DA PESCA A ESCOLA

Foi pensando dessa forma que comecei a escrever meus primeiros poemas ainda na adolescência, com dezesseis ou dezessete anos, mas como o pescador é desvalorizado até mesmo por seus pares, nunca pude realizar o meu sonho de levar a minha literatura de cordel para o ambiente escolar como objeto de estudo.

Assim como entrei na vida de pescador, ou a pesca entrou em minha vida, da mesma forma saí.

Quando parei de pescar, por motivos também de saúde, fiquei desolado, parado, sem trabalhar por quase dois anos até conseguir trabalho de vigia na escola da minha nova comunidade.

Trabalhar em uma escola era unir o útil ao agradável. Eu gostava de ler, adorava escrever e estava justamente no lugar tão sonhado durante anos, a escola. Ali eu poderia voltar a estudar e realizar o meu grande sonho. 

Eu não temia o preconceito, a discriminação ou coisa do gênero, é que minha experiência de pescador tornara-me muito tímido, esse talvez tivesse sido o meu maior defeito durante muito tempo, tanto que eu não conseguia mostrar a minha literatura, os meus cordéis para ninguém com medo de ser reprovado, como fora no passado pelos meus amigos.

Certo dia, já na escola onde trabalho, decidi pela minha experiência de leitor, mostrar para as pessoas os meus pequenos escritos, que logo foram chamados obras de literatura, passando a ser material didático para os alunos locais. Entre esses materiais produzidos para e com os alunos da escola local, está o projeto “PESCANDO SABERES”. Produzido em parceria com a professora Lediane Aranha do Nascimento, um livro, onde foram utilizadas cada uma das letras do alfabeto para criar um texto de cordel e em cada texto falando de algo sobre educação ambiental, que passou a ser utilizado na sala de aula de outras escolas do município.

Com os estímulos dos professores e outros profissionais de educação fiz o concurso público do município de Bragança em 2011, e fui aprovado, pela primeira vez, apenas com o conhecimento que havia adquirido nos livros.

Uma vez funcionário efetivo, resolvi voltar a estudar, ou melhor, resolvi me certificar de que a leitura que eu havia praticado no passado estava surtindo efeitos em minha mente, fui assistir às aulas, não na referida escola, mas através do rádio, do sistema educativo radiofônico de Bragança (SERB).

O SERB me certificou a nível fundamental e no último ano do fundamental fiz a prova do Enem e obtive proficiência no nível médio, com certificação pelo IFPA, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará. No ano seguinte fui aprovado novamente via Enem, pelo SISU, agora para cursar a tão sonhada faculdade de letras da UFPA, Universidade Federal do Pará.

Durante a graduação no curso de Letras Língua Portuguesa conheci professores, pesquisadores, de outras áreas do conhecimento e comecei a me interessar por esse lado, queria ser pesquisador. Depois de algumas experiências em sala de aula, com grandes pesquisadores, fui inserido no ESA, grupo de Estudos Socioambientais Costeiros.

Meus conhecimentos de pescador me deram suporte para que produzisse, como coautor, em parceria com outros pesquisadores do grupo, a cartilha “DA PESCA A ESCOLA; ECOLOGIA COSTEIRO-ESTUARINA E OS SABERES PESQUEIROS LOCAIS”, um material multidisciplinar, com um título que refletia minha história de vida.

Depois dessa primeira cartilha, minha história ficou bem mais conhecida, tenho participação direta e indiretamente em outros livros e antologias poéticas, além de 52 folhetos de cordel a serem publicados.

A partir dessa experiência tenho participado de inúmeros eventos, tanto na minha área de conhecimento cientifico, língua portuguesa, quanto em outras em que, para mim, teoricamente é desconhecida e ainda prevalece a minha experiência e pratica, como no curso de engenharia de pesca.

Tenho trabalhado com a literatura de cordel, realizado o meu grande sonho, na sala de aula de diversas escolas do município de Bragança e até de outros municípios vizinhos, como Tracuateua e Augusto Correa.

Tenho feito diversos cursos presenciais e EAD: Gestão Ambiental e Desenvolvimento Sustentável; Espanhol (básico, intermediário e avançado); Educação para o pensar.

Tenho participado de eventos nacionais e internacionais, como palestrante e ouvinte. Apresentei o trabalho intitulado “O PESCADOR É LUNAR” na SESSÃO: VIVÊNCIAS INTERCULTURAIS DO ESAC COM COMUNIDADES ESTUARINOCOSTEIRAS NA AMAZÔNIA PARAENSE durante o XVI Congresso da Sociedade Internacional de Etnobiologia, realizado em agosto de 2018 em Belém.

Participei como autor do lançamento da cartilha Ecologia Costeiro-estuarina e os saberes pesqueiros locais durante o XVI Congresso da Sociedade Internacional de Etnobiologia.

Participei como debatedor na mesa redonda “Desmantelando as fronteiras dos saberes da Amazônia” no dia 07 de dezembro de 2018 das 10h30 as 12h00, no I Seminário Internacional de Linguagens, Saberes e Sociodiversidade na Amazônia, na Universidade Federal do Pará- Campus de Bragança.

Participei do XVI Congresso da Sociedade Internacional de Etnobiologia, do XII Simpósio Brasileiro de Etnobiologia e Etnoecologia, da IX Feira Estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação e da I Feira Mundial da Sociobiodiversidade.

. Participei da IX Feira Estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação e da I Feira Mundial da Sociobiodiversidade como monitor do ETNOZITO.

Participei como palestrante da aula inaugural do mestrado Acadêmico da turma de 2020 do programa de Pós-Graduação em Linguagens e Saberes da Amazônia no campus de Bragança - PA. E em 2021, entre para o programa como mestrando.

Todos esses feitos me fizeram entrar para a ALB - Academia de Letras do Brasil - Seccional de Bragança - PA, onde ocupo a cadeira de número 19. Em 2021 entre para o CONCLAB – Confederação de Ciências, Letras e Artes do Brasil, onde ocupo a cadeira de número 96.

{Cadeira n° 19}

Patrono: Manuel Ramos de Sousa

 

Manuel Ramos de Sousa, mais conhecido como Beri, não foi nenhum intelectual durante sua passagem por este plano espiritual, ao contrário era uma pessoa simples, pescador, semialfabetizado, sabia ler e escrever, mas não dominava com clareza as formalidades gramaticais da Língua materna. Nasceu na vila de Caratateua, no dia 1º de janeiro de 1936.

Seus pais, Tomé Ramos da Silva, natural da vila de Caratateua, município de Bragança, nordeste do estado do Pará, também era um homem de pouca instrução, e dona Francisca Fernandes de Sousa, descendente de nordestinos, uma das primeiras pessoas a nascer na vila de pescadores de Ajuruteua.

Manuel Ramos de Sousa, ou Beri, apelido caseiro e como este gostava de ser chamado, ficou órfão de mãe ainda criança e durante toda a sua vida, dedicou-se a labuta no mar, como pescador artesanal.

Casou-se duas vezes, com a primeira esposa, de quem era primo legitimo, viveu doze anos e não tiveram prole. Com a segunda, mãe deste poeta, viveu até sua partida deste plano terreno, durante quarenta e dois anos e tiveram doze filhos.

Apesar do seu pouco estudos e sem muito poder aquisitivo, o Beri sempre mostrou-se um verdadeiro pai, com responsabilidade e carinho, estando a frente e tomando para si os problemas e dificuldades da família e mesmo assim, apostou na educação dos filhos, embora que estes não tenham conseguido, por motivos diversos, realizar o seu mais precioso sonho de ver seus filhos na universidade, enquanto ele vivia.    

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